O Bloco de Esquerda é definido nos seus estatutos como uma esquerda “ socialista e popular”. O partido-movimento sempre se pautou pela defesa de uma linha anticapitalista, feminista, ecologista, abraçando também as lutas LGBTIQ e a luta pelos direitos dos animais. Há sempre espaço para novas lutas no seio de uma esquerda que se quer grande e que está decidida a fazer “ a luta toda”.
O Bloco, do qual fazemos orgulhosamente parte, forjou-se com e pela necessidade de construir uma nova esquerda que nada esperasse do PS e não ficasse à espera do PCP. Foi assim que findaram os anos 90, como um partido que era e é “tecnologia de ponta”, intransigente na recusa em escolher entre a Terceira Via do PS de Guterres e a ortodoxia pró-soviética do PCP.
Dezanove primaveras depois do seu nascimento, o Bloco defronta-se com a necessidade de debater o seu futuro que, desde 2015 e pela primeira vez, se confunde com o futuro do governo. O apoio parlamentar que decidimos dar ao governo do Partido Socialista desde 2015, aprovado pela Mesa Nacional, foi uma decisão acertada, na medida em que travou o programa de empobrecimento e repôs os rendimentos dos trabalhadores que a direita lhes tinha roubado. No entanto, muito longe de um pertenço socialismo apregoado por Pedro Nuno Santos no Congresso, o PS governa, ora ao centro, ora à direita, votando vezes sem conta diplomas com o PSD e o CDS, e impedindo assim a reposição dos direitos dos trabalhadores, o combate à precariedade, a nacionalização dos setores estratégicos, as 35 horas para todos. Concluímos que continua a existir no Parlamento um muro da vergonha formado por quase 200 deputados de direita que impedem a viabilização de medidas de crucial importância para o nosso país.
Neste contexto, o Bloco não pode conformar-se a ser a moleta do social-liberalismo. Na X Convenção, Catarina Martins afirmou: “Claro que queremos ser poder, e governar”. Não voltou a dizê-lo desde então. A nossa vontade em ganhar uma maioria social para conquistar o governo deve ser afirmada com toda a clareza, sobretudo agora que em vários pontos do mundo se abrem novos caminhos de esperança para os povos.
Se há algo que uma esquerda socialista não tem o direito de esquecer é quem serve e para quem trabalha. Não somos um partido interclassista, somos um partido de classe e é pelo povo e para o povo que trabalhamos e nos batemos todos os dias. Não somos um partido reformista: a reposição de direitos dos trabalhadores e a realização de reformas, por nós ou por outros, não nos pode, de forma nenhuma, contentar.
Sabemos o difícil que é fazer face ao capitalismo globalizado e enfrentar a burguesia, e temos bem presente nas nossas memórias a vergonhosa traição de Tsipras e do Syriza ao glorioso OXI do povo grego de 5 de julho de 2015. Sabemos também o complexo que é governar depois de ganhar eleições para um qualquer parlamento burguês. Mas sabemos, sobretudo, que, ao contrário do que defendeu e afirmou Juan Carlos Monedero no seu livro Curso Urgente de Política para Gente Decente, é impossível “construir o muro e a brecha ao mesmo tempo” . O nosso caminho é outro. É o de abrir caminho para libertar os povos da exploração a que são sujeitos. E esse caminho implica um programa de rutura com o capitalismo: nacionalização da banca e dos seguros, nacionalização sem indemnização das grandes empresas nacionais, reforma agrária para redistribuir a terra, aumento geral dos salários, saída da NATO, reestruturação da dívida, saída da União Europeia. Um governo socialista tem de enfrentar a burguesia nacional e estrangeira e levar ao máximo do seu potencial todas e cada uma das lutas dos operários nos seus locais de trabalho. É preciso romper o tabu e colocar abertamente a questão da propriedade no seio do Bloco, visto que sem propriedade público dos meios de produção não há Socialismo.
Por fim, esta esquerda precisa de afirmar o seu Internacionalismo, pois não se pode concretizar o Socialismo isolados da luta dos outros povos. O Internacionalismo de classe nada tem a ver com a integração europeia e com o federalismo, mas implica, pelo contrário, a recusa em participar nessa União da burguesia (vulgo Estados Unidos da Europa), morto que está o europeísmo de esquerda.
Se tivermos a coragem e a lucidez de seguir esse caminho lograremos não só a desforra dos nossos sonhos que o mercado e as troikas destruíram, como impediremos que se ponha a Revolução na gaveta. É pelo Socialismo e pela emancipação que nos movemos, que romperemos cadeias e é com a Revolução no coração que conquistaremos, um a um, os dias que o futuro nos trará.