Share |

ALGUMAS REFLEXÕES

O poder Local Democrático é de tal modo importante na gestão da vida dos cidadãos que deve implicar, da parte de todos nós, uma reflexão profunda sobre as políticas locais, sobre as práticas autárquicas, a transparência que se exige, fermento de primeira qualidade para mais democracia e participação cidadã.

A maior proximidade entre os cidadãos e a política autárquica, no tratamento das questões do dia-a-dia dos eleitores, faz do poder local a primeira e mais acessível montra do Estado, o que lhe acarreta responsabilidades acrescidas.

Por isso, os cidadãos que exercem cargos electivos autárquicos, devem encará-los como um serviço prestado à comunidade e devem pautar a sua acção por uma rigorosa observação de critérios de justiça, honestidade e transparência.

São as transgressões, mais ou menos graves duma conduta menos transparente, por parte dos agentes políticos, as primeiras responsáveis pelo afastamento dos cidadãos da política ou até da sua adesão a projectos populistas, com as consequências gravosas que se vão observando por todo o mundo.

Não se pretende fazer considerações de caracter moralista, mas antes colaborar na defesa e no aprofundamento do projecto democrático do Poder Local.

Alguma reflexão pode ajudar a um desempenho ainda mais transparente das autarquias e dos autarcas, por exemplo, uma informação pública clara, precisa e atempada dos actos administrativos e políticos, um escrutínio cuidadoso, por parte das Assembleias Municipais e de Freguesia, das acções dos executivos; o evitar do recurso sistemático e não justificado a ajustes directos.

Para além disso, há algumas medidas que podem ajudar a aumentar a transparência na actividade autárquica, como seja, a substituição das empresas municipais por serviços directamente dependentes e geridos pelo município, com transferência para os quadros da câmara do pessoal, nos termos da lei. Assim como, uma prática permanente de concursos de caracter público, devidamente publicitados, abertos e transparentes para a aquisição de bens e serviços, ou para admissão de pessoal.

 A recusa de externalizações dos serviços, isto é, o recurso a entidades externas para, com recurso ou não a engenharias financeiras, transferir competências com um aumento na opacidade da transparência de métodos, deve constituir um ponto de honra. Estão neste caso a recolha de resíduos, a limpeza urbana ou o fornecimento público de água.

Tudo isto ajuda a credibilizar a política aos olhos dos cidadãos e promover uma maior participação. Nesse sentido devem ser incentivados os orçamentos participativos, como forma de concretização da participação cidadã. Não um arremedo de democracia que por aí se faz, mas um escrupuloso cumprimento das regras democráticas.

A limitação de mandatos das candidaturas para as presidências é uma medida salutar para impedir as tentações de perpetuação no poder, susceptíveis de acarretar habituações, dependências, caciquismos e outros atropelos à democracia. Os truques habitualmente utilizados para rodear estas medidas legais, como rotações de lugares ou regressos após períodos de interrupção nos mandatos, são de recusar, em nome da transparência.

A participação dos cidadãos no debate e na proposta de soluções é crucial na construção de uma democracia participada e na concretização do Poder Local Democrático.

A eleição dos autarcas não pode desresponsabilizar os eleitores do acompanhamento e fiscalização permanentes dos actos dos eleitos. Não podemos deixar em mãos alheias, mesmo que eleitas, a defesa dos nossos interesses.

Uma cidadania activa é condição de mais coesão social e territorial, de mais transparência, de defesa do meio ambiente por um crescimento sustentável e de uma democracia mais efectiva.

O nosso país, é sabido, um dos mais centralistas de toda a Europa, só comparável à Bulgária, com a ineficiência que isso acarreta aos serviços prestados.

A simples municipalização dos serviços detidos pelo Estado Central traz problemas que começam pelo facto de a maioria esmagadora dos municípios portugueses terem um número de habitantes tão reduzido que não têm possibilidade de assegurar a prestação dos serviços transferidos, por carência de meios humanos.

As Comunidades Intermunicipais (CIM) e as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR), de nomeação governamental, não são democraticamente representativas e não passam de delegações do poder central. Não se pode pensar em descentralização sem pensar em Democracia.

Só a criação de Regiões, como autarquia intercalar, alias prevista na Constituição da República, pode superar as assimetrias regionais, uma das principais causas das desigualdades entre o litoral e o interior.

O papel a desempenhar pelos órgãos regionais, para além de legitimados pelo voto directo dos eleitores pode assegurar uma maior e melhor defesa dos interesses regionais, agregando as mais-valias das comunidades diversas, dando-lhes escala e capacidade interventiva mais adequada.

As prestações dos serviços básicos às populações a partir da escala regional tornam-se mais viáveis, colmatando o facto da reduzida dimensão dos municípios poder ser um entrave para um desenvolvimento diferente, mas equilibrado.

A regionalização democrática não pode continuar ser vista como uma divisão do país que é de dimensão média, como alguns pretendem, mas como uma forma de dar homogeneidade a um país com enormes assimetrias regionais, a quem um centralismo desadequado e caduco nunca foi capaz de apresentar projectos exequíveis e muito menos de dar soluções.

23.02.2017